Simpósio Sobre Recuperação de Áreas Degradadas e a Importância das Matas Ciliares

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Por: Carlos S. Rodrigues (Instituto 5 de Junho)

Historicamente sabemos que a ocupação dos espaços no território nacional caracterizou-se pela inexistência de planejamento, com conseqüente destruição de muitos recursos naturais. (...) A falsa idéia de que os recursos naturais eram inesgotáveis e que o desenvolvimento estava sempre associado à ampliação de fronteiras prevaleceu até o final dos anos 70 e 80 do século passado. Na época as próprias universidades ensinavam a melhor forma de desmatar (uso de correntões, trator de esteira, etc.), para promover a ampliação de áreas agricultáveis ou para pastagens. Os recursos hídricos, tão dependentes das formações ciliares, eram igualmente considerados inesgotáveis.

Assim, o processo de fragmentação florestal, mais intenso nas regiões economicamente mais desenvolvidas, resultou em um conjunto de problemas ambientais como a extinção de várias espécies da flora e fauna, associada às mudanças climáticas locais, ao desequilíbrio biológico, à erosão dos solos e ao assoreamento dos cursos d'água, entre outros.(...)

Assim começa a carta de apresentação do II Simpósio Regional de Atualização em Recuperação de Áreas Degradadas Com Ênfase em Matas Ciliares, do qual o Instituto 5 de Junho participou (subentenda-se aqui o uso de metonímia) durante a última semana de Outubro na Cidade de Mogi Guaçu, SP.

A iniciativa do Instituto de Botânica de São Paulo e da Faculdade Municipal Professor Franco Montoro (FMPFM), de organizarem um evento científico destinado a reunir a comunidade científica e acadêmica que atua nesta área evidencia a importância atual do tema não só para os profissionais da área ambiental mas também, e principalmente, para a população como um todo.

Durante o evento foram abordados temas como a importância da diversidade de espécies vegetais em processos de restauração ambiental, da pesquisa com sementes florestais nativas, da utilização de parâmetros de quantificação e monitoramento de biomassa, de reflorestamentos compensatórios, de interações solo–planta, da fauna para processos de recuperação de áreas degradadas, da adequação ambiental de propriedades agrícolas, e de vários outros pontos que podem parecer um emaranhado de termos sem sentido, mas que as pessoas que conhecem um pouco desta área sabem ser de suma importância para o desenvolvimento de projetos e políticas públicas relacionadas à área ambiental. Isto tudo além, claro, das conversas de bastidores que são sempre produtivas, além de proporcionar contato com pessoas interessantes de todo o país (e aqui não posso deixar de citar a Edilane e o Dilton, de Santa Catarina, a Luciana, de São Paulo, Natacha, da Bahia, a Tanea, do Rio Grande do Sul, e todos os demais que, espero, hão de perdoar minha incapacidade de guardar nomes... todos ótimas companhias!).

Mas por que, afinal, pessoas de várias partes do Brasil viajam –às vezes dias– para se reunir em uma cidade e discutir sobre recuperação de matas ciliares? Qual a importância destas matas para o ambiente e para os animais (inclusive nós)?

Comunidades biológicas, ou seja, o Cerrado, aquela mata perto da sua casa –pra quem ainda tem o privilégio– ou aquele rio em que você pesca desde criança, normalmente levaram de milhares a milhões de anos até chegarem ao estado em que você conhece hoje. Com isso, quero dizer que na natureza as grandes mudanças normalmente acontecem em períodos muito longos. A grande questão que gerou toda esta preocupação atual com as florestas e os oceanos e os bichinhos bonitinhos e coloridos que vivem pelo mundo é que as ações da espécie humana (nós!) estão causando mudanças na natureza a uma velocidade muitas, mas muitas vezes superior ao que aconteceria naturalmente. E isto é ruim para a natureza? Sim! Mas é pior ainda para nós, seres humanos!

Um rio, por exemplo, que surgiu há 200 mil anos atrás e que normalmente só iria desaparecer naturalmente daqui a outros 50 ou 100 mil anos, pode, por causa de ações humanas secar em 100 anos, e daí seus filhos –tá, seus netos– não vão mais poder pescar lá. Bobagem! Como é que um rio seca em 100 anos?! E é aqui que volto no nosso assunto das matas ciliares. Por que proteger estas matas? Além do fato das margens de todos os rios serem protegidas por lei como APPs (Áreas de Proteção Permanente) e, portanto, poderem gerar uma multa enorme pra quem não as preserva, e um gasto ainda maior para a sua recuperação posterior, a vegetação (as matas) nas bordas dos rios funciona como um filtro natural, retendo defensivos agrícolas, poluentes e sedimentos. Literalmente um filtro que impede que a água seja contaminada e o leito do rio seja entupido coberto pelos materiais carregados pelas chuvas.

Além disto, com a diminuição constante da quantidade e tamanho das áreas naturais preservadas, as matas ciliares se tornam ainda mais importantes pois, como são protegidas por lei, teoricamente não poderiam ser destruídas e funcionariam como corredores ecológicos para ligar áreas distantes, fazendo com que estas áreas tenham uma chance maior de durar mais tempo. Metaforicamente, se você pensar nas áreas preservadas como cidades onde vivem vários tipos de pessoas, então as matas ciliares seriam as estradas que permitem que estas pessoas possam ir de uma cidade a outra. Assim, não vão precisar se matar quando a cidade ficar cheia demais e não tiver mais comida pra todos por exemplo. Assim acontece na natureza, e as matas ciliares permitem que os bichos e plantas, fungos, bactérias, duendes e gnomos que vivem em um local possam migrar para outro e assim conseguimos manter uma quantidade maior de árvores, passarinhos coloridos, borboletas, aranhas, cobras, escorpiões, sapos e outros tantos que podem não parecer tão importantes mas que tem papéis fundamentais para a dinâmica ambiental.

Por tudo isto é que pessoas interessadas em discutir as melhores formas para preservar e recuperar estas áreas se dão ao trabalho de saírem de suas cidades, com a expectativa de contribuir de forma relevante para a mudança deste quadro ainda tão preocupante em nosso país.

E para provar que não ficou tudo na expectativa, vou disponibilizar aqui a Carta de Mogi Guaçu, elaborada durante o simpósio e discutida e aprovada por todos os participantes ao final do evento (eu inclusive palpitei em alguns pontos, com todo meu vaaasto conhecimento e experiência na área!), que foi entregue à Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo recomendando ações referentes ao problema. Para aqueles que se interessam pela área, recomendo que leiam. Quem sabe o próximo encontro não seja na sua cidade?!

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